sábado, 26 de setembro de 2009

Um outro 11 de setembro

Desde a minha adolescência, a partir do tempo em que passei a me interessar por política internacional, dois acontecimentos históricos marcaram de forma profunda minha consciência política e, anualmente, eu me lembrava deles com tristeza e indignação: as bombas atômicas que os Estados Unidos lançaram sobre o Japão, em 06 e 09 de agosto de 1945, e o golpe militar no Chile, armado e financiado pelo governo norte-americano, alimentado pela burguesia chilena e executado por Pinochet e seus militares, em 11 de setembro de 1973. Ambos me fazendo ver até onde vai a maldade de alguns seres humanos, e que a demonstração do poderio e da dominação imperialista não tem limites éticos, morais ou legais.
Salvador Allende, o Presidente deposto e assassinado naquele golpe, ousou sonhar, junto com os que o elegeram, em construir um Chile livre e soberano. Foi impedido porque daria mau exemplo aos outros povos.
Milhares de chilenos foram torturados e assassinados, e poucos governos fizeram qualquer sinal de preocupação ou solidariedade ao povo perseguido.
Por isso, quando anualmente nos lembrarmos dos mortos nos ataques terroristas aos Estados Unidos em 11 de setembro de 2001, lembremo-nos também dos chilenos mortos e desaparecidos, e de sua jovem democracia assassinada em 11 de setembro de 1973.

Gilvan Almeida

sábado, 12 de setembro de 2009

Conversa sobre a inveja

Para mim a internet tem sido fonte de aprendizados, seja em pesquisas, como em conversas com amigos. Alguns registros que salvei sobre um assunto interessante, a inveja.

Gilvan Almeida

Uma amiga pergunta: Eu queria que alguém me informasse quais características, sintomas, expressões, sei lá o quê a pessoa pode perceber como a inveja se manifesta. Pelo que me consta dificilmente alguém se diz invejoso. Por favor, sem muitas delongas de conceitos formais, o momento que estou vivendo é repleto de conceitos, são eles que direcionam o conhecimento, sei disso, mas é importante não nos formatarmos num mesmo padrão, onde até as palavras são as mesmas. Mas me digam, por favor, quero entender melhor essa tal de inveja.

O que penso, sendo conciso conforme a amiga pede: Algumas filosofias espiritualistas e religiosas têm o desejo como fonte de todo o sofrimento humano. Concordo com elas.
Assim, uma forma que procuro me monitorar quanto a estar ou não sentindo inveja é vendo a quantas andam os meus desejos. Entendo, então, que na raiz da inveja está o desejo, principalmente o desejo de ter algo de alguém, ou igual ou ainda melhor que o de alguém, seja um bem material, um amigo, um amor, inteligência, êxito na vida, conhecimentos, etc.

Outra amiga opina: Outro dia recebi um e-mail de um amigo falando que estava com "inveja branca" das fotografias que mostrei da minha viagem a Nova York; achei interessante, porque ainda não tinha visto essas duas palavras juntas. Entretanto, vejo que a inveja branca é sadia, de paz e amor, enquanto a inveja no sentido literal da palavra pode ser definida como uma vontade frustrada de possuir os atributos ou qualidades de um outro ser, pois aquele que deseja tais virtudes é incapaz de alcançá-la, seja pela incompetência e limitação física, seja pela intelectual. Confesso, que tenho uma certa dificuldade de lidar com o sentimento da inveja e do ciúme, na hora não sei que medida adotar quando a pessoa está com esse sentimento comigo.
Um amigo filosofou: Ao tratarmos da inveja, ou de qualquer outro tema envolvendo sentimentos não muito nobres, devemos ter o anjo da humildade como guia, assim, admitiremos que não falamos dos outros, mas de nós mesmos, como seres imperfeitos e desequilibrados que somos. Entendo que a inveja é uma espécie de rejeição interior que sentimos por não sermos como os outros são. É uma forma de auto-punição e de cobrança interior, injusta muitas vezes, outras nem tanto, que fazemos a nós mesmos. Como diz aquela música do maluco do Raul Seixas, "é sempre mais fácil achar que a culpa é dos outros". Através da inveja, transferimos a culpa pelos nossos fracassos, na forma de vibrações negativas, para os outros. Em verdade, é sintoma da baixa auto-estima e, é ela, que semeia dentro de nós a arrogância e o egoísmo. A arma que a inveja utiliza para nos dominar é a comparação. Mas como fugir dela se vivenciamos, de forma inevitável, o processo comparativo no dia a dia? Quer a gente queira ou não a vida cotidiana é feita de comparações. Para tudo há um modelo, um padrão, um referencial. Ou será que não? Talvez, o melhor exercício seja parar de se comparar com os outros e partir para comparações internas. Compare o que você foi ontem com o que é hoje. É bem possível que, com a auto-comparação, possamos identificar falhas que são nossas, e não dos outros. Será que se compararmos nossos sentimentos e atitudes, de hoje e do passado, não estaremos patrocinando batalhas vitoriosas na guerra contra a inveja? E será também que não estaremos ampliando nossa capacidade de admirar o bom exemplo que vem das outras pessoas, transformando inveja em admiração, que é um caminho bom na busca por evolução.

Acrescentei: Há um tempo havia um adesivo de colocar em vidro de carro que dizia assim: “a inveja é a arma dos incompetentes." Encontrei estas outras frases que mostram a inveja de uma forma que também concordo. Vejo também que a inveja não é só de coisas materiais. Estas são até mais grosseiras e fáceis de serem vistas. Há a inveja de amizades, de dons/qualidades que alguém possua, de quem tem conhecimento intelectual e espiritual.

"O ciúme traduz o sentimento de propriedade, ao passo que a inveja mostra o instinto de roubo."(Autor Desconhecido)

"Inveja é o ódio da felicidade alheia, ou dor que se sente no coração por causa do sucesso alheio."(Albertano da Brescia)

"Duas são as feras que em nós produzem mais danos: uma cruel e selvagem, a inveja; outra, mansa e doméstica, a adulação. "(Juan Luis Vives)

"Ciúme é querer manter o que se tem; cobiça é querer o que não se tem; inveja é querer que o outro não tenha."(Zuenir Ventura)
Disse um pouco mais: Acho muito delicada (e às vezes enganosa) a percepção de achar que está sendo vítima de inveja. Já vi pessoas dizerem isto, que estavam falando dela com inveja do que ela tinha e do que ela era, e, na verdade, ela estava mesmo era se exaltando, “siachando”, como dizem. Observe que estou dizendo de uma experiência de observação e não dizendo que você está enquadrada nisto. Por isto que acho delicado, porque é algo muito difícil de avaliar com isenção e equilíbrio. Mas acho também possível perceber quando alguém está com inveja de outra, pelas palavras, pelo olhar, conforme foi colocado, e também quando é aquela “..."velha" rabugenta, perseguidora, suja, sem dentes, bafo fétido e sinistra...” facilmente vista, só que, às vezes, a inveja pode ser bela, insinuante, sutil, parecendo amiga, chega-se de mansinho para invejar e algumas vezes roubar, se apoderar, do objeto do seu desejo. Como prevenir então? Uma forma que vejo: discrição no que se é, no que se tem, no que se pode. Não fazer propaganda. Lembro do Milton Nascimento quando diz “amigo é coisa pra se guardar debaixo de sete chaves, dentro do coração...” Aqui interpreto que ele não está dizendo para se apossar do amigo, nem esconder o amigo, nem ter ciúme do amigo, querer só para si. Ele diz para cuidarmos do amigo, sendo uma das formas através da discrição, não propagandeando aos sete mares que é o amigo daquela pessoa, de tão grande que é a amizade com ela. É sujeito despertar em alguém a inveja, especialmente nos mais carentes e de baixíssima auto-estima.

Texto de autor desconhecido: “A inveja é um dos sete pecados capitais. É considerada pecado porque uma pessoa invejosa ignora suas próprias bençãos e prioriza o status de outra pessoa no lugar do próprio crescimento espiritual. Outra expressão muito comumente usada, no dito popular, para designar a inveja é a "dor de cotovelo".

quarta-feira, 2 de setembro de 2009

Grandes escritores I : Fernando Pessoa

Minha mãe me ensinou a ter e a sempre cultivar a paixão pelos livros. Enquanto universitária do Curso de Letras da UFAC, ela foi me apresentando os livros que ia lendo e eu, iniciando a adolescência, ia me deixando “contagiar” pelo amor que ela tinha pela literatura. O sentimento que me envolve ao ler um bom livro gera em mim um estado semelhante a uma paixão, fico pensando, envolvido, procurando tempo para ler, saboreando cada página e deixando a mente e o coração livres para se manifestarem conforme a história me conduz. É uma espécie de amor, de prazer, onde a concentração e a entrega me transportam por viagens a lugares, povos e culturas distantes, sentimentos e memórias do que já vivi, do que aspiro viver e, até mesmo, trazendo à tona saudades não sei do quê ou de quem. É muito bom encontrar escrito algo que penso e sinto semelhante, o que muitas vezes me alivia por ver que, por mais estranho que seja, tem mais alguém que vê da mesma forma. Quando gosto de um livro tenho por hábito procurar ler os outros daquele autor. Já fiz assim com José de Alencar, José Lins do Rego, Machado de Assis, Albert Camus, Gabriel Garcia Marques, Clarice Lispector, Eça de Queiroz, Rainer Maria Rilke, Alexandre Dumas, Jorge Amado, Antônio Callado, Vitor Hugo, Agatha Cristie, Lobsang Rampa, Manoel Puig e outros.
Recentemente, li o texto Antropofagia, de Rubem Alves, no livro “Ostra feliz não faz pérola”, que diz assim: “Para comer meus próprios semelhantes, eis-me sentado à mesa”, escreveu Augusto dos Anjos (“Eu”, 1912, Revista de Antropofagia 1). ' Eu escrevo antropofagicamente: quero que me devorem. Eu leio antropofagicamente: quero devorar aquele que escreveu. Nietzsche sentia o mesmo e disse que só amava os livros escritos com sangue. Como na Eucaristia. A eucaristia é um ritual antropofágico. “Esse pão é o meu corpo; esse vinho é o meu sangue. Comei. Bebei.” Literatura é antropofagia, o que está de acordo com a teologia do evangelho de João, que a afirma que a Palavra é igual à carne. ’ E eu, que nem me imaginava antropófago, deliciei-me ao ver que a minha tendência a “devorar” autores e suas obras também acontece com muitas outras pessoas.
Meus amores literários sempre foram por obras escritas em prosa. Não tinha paciência, sensibilidade e compreensão para escritos em verso, até me encontrar, recentemente, de forma mais intensa, com o escritor Fernando Pessoa, minha atual paixão. Falando isto a um amigo, ele me disse: “você ainda não tinha suficiente maturidade intelectual e sentimental para penetrar na alma e no coração da poesia”. Já gostava de algumas poesias dele, recitadas pela cantora Maria Betânia em alguns shows; lidas em mensagens e sites na internet e também através de um CD, A música em Pessoa, em que musicaram algumas poesias dele, e que são cantadas por Nana Caymmi, Tom Jobim, Marcos Nanini e outros. Agora, estou definitivamente conquistado. Li o livro O Eu profundo e os outros Eus e acredito ter chegado mais perto da alma e do coração do poeta, e pude sentir mais a genialidade de Fernando Pessoa e seus heterônimos. Muitas vezes uma frase de 5 ou 6 palavras me fazia parar a leitura para refletir, buscar os sentimentos do autor, e também os meus, envolvidos no que ele estava querendo dizer, e entender onde, como e por quê me tocavam. Gosto de escritores que me desafiam, que me tiram da inércia de sentimentos e da mesmice intelectual, e dão um “nó” na minha compreensão, além de estilhaçar as minhas convicções e paradigmas, e Pessoa veio se unir a outros que fazem isto comigo, especialmente Kafka, Camus, Gabriel Garcia Marques, George Orwell, Erasmo de Roterdã, Machado de Assis, Clarice Lispector, Rainer Rilke, Arthur Rimbaud.
Adquiri na I Bienal da Floresta do livro e da leitura as Poesias Completas de Álvaro de Campos, Ricardo Reis e Alberto Caeiro, os três principais heterônimos de Fernando Pessoa, e estou agora ampliando meus conhecimentos sobre o universo deste Mestre da palavra. Deixo-os com esta poesia dele, que foi a primeira que gostei, na voz da Betânia, na década de 70, e que só recentemente soube do nome, o que me fez gostar mais ainda:

EROS E PSIQUE

Conta a lenda que dormia
uma Princesa encantada
a quem só despertaria
um Infante, que viria
de além do muro da estrada.
Ele tinha que, tentado,
vencer o mal e o bem,
antes que, já libertado,
deixasse o caminho errado
por o que à Princesa vem.
A Princesa Adormecida,
se espera, dormindo espera,
sonha em morte a sua vida,
e orna-lhe a fronte esquecida,
verde, uma grinalda de hera.
Longe o Infante, esforçado,
sem saber que intuito tem,
rompe o caminho fadado,
ele dela é ignorado,
ela para ele é ninguém.
Mas cada um cumpre o Destino,
ela dormindo encantada,
ele buscando-a sem tino,
pelo processo divino
que faz existir a estrada.
E, se bem que seja obscuro
tudo pela estrada fora,
e falso, ele vem seguro,
e vencendo estrada e muro,
chega onde em sono ela mora.
E, inda tonto do que houvera,
a cabeça, em maresia,
ergue a mão, e encontra hera,
e vê que ele mesmo era
a Princesa que dormia.
Fernando Pessoa – Cronologia
http://www.insite.com.br/art/pessoa/

13 de junho de 1888 - Nasce em Lisboa, às 3 horas da tarde, Fernando Antônio Nogueira Pessoa.
1896 - Parte para Durban, na África do Sul.
1905 - Regressa a Lisboa.
1906 - Matricula-se no Curso Superior de Letras, em Lisboa.
1907 - Abandona o curso.
1914 - Surge o mestre Alberto Caeiro. Fernando Pessoa passa a escrever poemas dos três heterônimos.
1915 - Primeiro número da Revista "Orfeu". Pessoa "mata" Alberto Caeiro.
1916 - Seu amigo Mário de Sá-Carneiro suicida-se.
1924 - Surge a Revista "Atena", dirigida por Fernando Pessoa e Ruy Vaz.
1926 - Fernando Pessoa requere patente de invenção de um "Anuário Indicador Sintético, por Nomes e Outras Classificações, Consultável em Qualquer Língua". Dirige, com seu cunhado, a Revista de Comércio e Contabilidade.
1927 - Passa a colaborar com a Revista "Presença".
1934 – Aparece “Mensagem”, seu único livro publicado.
30 de novembro de 1935 - Morre em Lisboa, aos 47 anos.