terça-feira, 29 de novembro de 2011

A moça tecelã

Há um tempo uma amiga me indicou este conto da Marina Colasanti. Hoje consegui ler. Gostei muito. Um anti-conto-de-fadas, do príncipe que se transformou em sapo. Revelação metafórica da vida sofrida de muitas mulheres, embora saibamos que também há princesas que se transformam em sapas.

Gilvan Almeida

PS: Fico feliz quando encontro uma imagem que "diz" o conteúdo do texto. Uma amiga me presenteou esta bela pintura de Arte Naif da pintora argentina Pilar Sala. Casamento perfeito.
Veja mais desta pintora em: http://www.artenaif.com/

A moça tecelã
Marina Colasanti

"Acordava ainda no escuro, como se ouvisse o sol chegando atrás das beiradas da noite. E logo sentava-se ao tear. Linha clara, para começar o dia. Delicado traço cor da luz, que ela ia passando entre os fios estendidos, enquanto lá fora a claridade da manhã desenhava o horizonte.
Depois lãs mais vivas, quentes lãs iam tecendo hora a hora, em longo tapete que nunca acabava.
Se era forte demais o sol, e no jardim pendiam as pétalas, a moça colocava na lançadeira grossos fios cinzentos do algodão mais felpudo. Em breve, na penumbra trazida pelas nuvens, escolhia um fio de prata, que em pontos longos rebordava sobre o tecido. Leve, a chuva vinha cumprimentá-la à janela.
Mas se durante muitos dias o vento e o frio brigavam com as folhas e espantavam os pássaros, bastava a moça tecer com seus belos fios dourados, para que o sol voltasse a acalmar a natureza.
Assim, jogando a lançadeira de um lado para outro e batendo os grandes pentes do tear para frente e para trás, a moça passava os seus dias.
Nada lhe faltava. Na hora da fome tecia um lindo peixe, com cuidado de escamas. E eis que o peixe estava na mesa, pronto para ser comido. Se sede vinha, suave era a lã cor de leite que entremeava o tapete. E à noite, depois de lançar seu fio de escuridão, dormia tranqüila.
Tecer era tudo o que fazia. Tecer era tudo o que queria fazer.
Mas tecendo e tecendo, ela própria trouxe o tempo em que se sentiu sozinha, e pela primeira vez pensou em como seria bom ter um marido ao lado.
Não esperou o dia seguinte. Com capricho de quem tenta uma coisa nunca conhecida, começou a entremear no tapete as lãs e as cores que lhe dariam companhia. E aos poucos seu desejo foi aparecendo, chapéu emplumado, rosto barbado, corpo aprumado, sapato engraxado. Estava justamente acabando de entremear o último fio da ponto dos sapatos, quando bateram à porta. Nem precisou abrir. O moço meteu a mão na maçaneta, tirou o chapéu de pluma, e foi entrando em sua vida.
Aquela noite, deitada no ombro dele, a moça pensou nos lindos filhos que teceria para aumentar ainda mais a sua felicidade.
E feliz foi, durante algum tempo. Mas se o homem tinha pensado em filhos, logo os esqueceu. Porque tinha descoberto o poder do tear, em nada mais pensou a não ser nas coisas todas que ele poderia lhe dar.
— Uma casa melhor é necessária — disse para a mulher. E parecia justo, agora que eram dois. Exigiu que escolhesse as mais belas lãs cor de tijolo, fios verdes para os batentes, e pressa para a casa acontecer.
Mas pronta a casa, já não lhe pareceu suficiente.
— Para que ter casa, se podemos ter palácio? — perguntou. Sem querer resposta imediatamente ordenou que fosse de pedra com arremates em prata.
Dias e dias, semanas e meses trabalhou a moça tecendo tetos e portas, e pátios e escadas, e salas e poços. A neve caía lá fora, e ela não tinha tempo para chamar o sol. A noite chegava, e ela não tinha tempo para arrematar o dia. Tecia e entristecia, enquanto sem parar batiam os pentes acompanhando o ritmo da lançadeira.
Afinal o palácio ficou pronto. E entre tantos cômodos, o marido escolheu para ela e seu tear o mais alto quarto da mais alta torre.
— É para que ninguém saiba do tapete — ele disse. E antes de trancar a porta à chave, advertiu: — Faltam as estrebarias. E não se esqueça dos cavalos!
Sem descanso tecia a mulher os caprichos do marido, enchendo o palácio de luxos, os cofres de moedas, as salas de criados. Tecer era tudo o que fazia. Tecer era tudo o que queria fazer.
E tecendo, ela própria trouxe o tempo em que sua tristeza lhe pareceu maior que o palácio com todos os seus tesouros. E pela primeira vez pensou em como seria bom estar sozinha de novo.
Só esperou anoitecer. Levantou-se enquanto o marido dormia sonhando com novas exigências. E descalça, para não fazer barulho, subiu a longa escada da torre, sentou-se ao tear.
Desta vez não precisou escolher linha nenhuma. Segurou a lançadeira ao contrário, e jogando-a veloz de um lado para o outro, começou a desfazer seu tecido. Desteceu os cavalos, as carruagens, as estrebarias, os jardins. Depois desteceu os criados e o palácio e todas as maravilhas que continha. E novamente se viu na sua casa pequena e sorriu para o jardim além da janela.
A noite acabava quando o marido estranhando a cama dura, acordou, e, espantado, olhou em volta. Não teve tempo de se levantar. Ela já desfazia o desenho escuro dos sapatos, e ele viu seus pés desaparecendo, sumindo as pernas. Rápido, o nada subiu-lhe pelo corpo, tomou o peito aprumado, o emplumado chapéu.
Então, como se ouvisse a chegada do sol, a moça escolheu uma linha clara. E foi passando-a devagar entre os fios, delicado traço de luz, que a manhã repetiu na linha do horizonte."

Marina Colasanti (Asmara, 26 de setembro de 1937) é uma escritora e jornalista ítalo-brasileira nascida na então colônia italiana da Eritréia. Ainda criança sua família voltou para a Itália de onde emigram para o Brasil com a eclosão da Segunda Guerra Mundial.
No Brasil estudou Belas-Artes e trabalhou como jornalista, tendo ainda traduzido importantes textos da literatura italiana. Como escritora, publicou 33 livros, entre contos, poesia, prosa, literatura infantil e infanto-juvenil.
Uma ideia toda azul é um livro seu de contos que ganhou o prêmio O Melhor para o Jovem, da Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil.
Em 2010, recebeu o Prêmio Jabuti pelo livro Passageira em trânsito.                                               Fonte Wikipedia

quarta-feira, 9 de novembro de 2011

Palavras de filmes

Costumo ler grifando os momentos mais marcantes nos livros, para ler depois, realimentar-me de algo que me fez bem ou que me despertou uma nova compreensão. Da mesma forma faço quando vejo filmes em casa. Se há palavras que me tocam o coração, paro o filme, repito a cena e anoto. Tenho um arquivo no computador chamado Palavras de Filmes. De vez em quando leio, e às vezes, encontro palavras que também servem para amigos. Compartilho com vocês.
Gilvan Almeida

P.S.: Agradeço a colaboração dos leitores com novas palavras de filmes para este post e, consequentemente, com meu arquivo. O amigo Marcos Afonso me lembrou desta frase simbólica do filme "O advogado do diabo": "A vaidade é o meu pecado predileto". Começaram a chegar mais palavras, então vou dar sequência no post, após o filme número 31.

1. Filme - Tinha que ser você:
O ex dizendo para a ex, no casamento da filha de ambos:
- “ ...(você) sempre soube fazer com que me sentisse um lixo em 30 segundos...”

2. Filme - Elizabeth: a era de ouro.
"...Quando a tempestade irrompe, cada um age conforme sua natureza. Alguns ficam mudos de pavor. Alguns fogem. Alguns se escondem. E alguns abrem as asas como águias e alçam vôo..."

3. Filme - A ponte de San Luiz Rey:
Procurem a cena em que essas palavras são ditas:
-“Agora ele descobriu o segredo do qual não nos recuperamos. O de que mesmo no mais perfeito amor uma das pessoas ama menos do que a outra. Talvez não haja duas pessoas que se amem igualmente.”

4. Vi em um filme que não lembro o nome:
-“Seremos como esses casais dos quais sentimos pena nos restaurantes? Somos os mortos que jantam?”

5. Filme - Encontros e desencontros:
-“Quanto mais você sabe quem é e o que quer, menos deixa que as coisas o perturbem.”

6. Filme - Dragão vermelho:
-"...Nossas cicatrizes têm o poder de nos lembrar que o passado foi real..."

7. Filme - Los Angeles, cidade proibida:
-“Você é um homem político. Tem olhos para as fraquezas humanas, mas não o estômago.”

8. Filme - Chocolate:
-"Não podemos medir nossa bondade pelo que não fazemos, pelo que negamos a nós mesmos, o que resistimos e a quem excluímos. Nossa bondade é medida por aquilo que aceitamos, pelo que criamos e por quem incluímos."

9. Filme - Metrópolis:
-“O mediador entre a cabeça e as mãos deve ser o coração.”
-“Cabeça e mão querem se juntar, mas eles não têm o coração para fazer isso. Ó mediador, mostre a eles o caminho de um ao outro...”
-“Sou o Consolador, que remove a preocupação, que coloca as mentes cansadas no travesseiro, que abre as portas para o Além.”

10. Filme - O segredo dos seus olhos:
Filme argentino que ganhou o Oscar de melhor filme estrangeiro de 2010:

1."Como se faz para viver uma vida vazia? Como se faz para viver uma vida cheia de nada?"

2."Não pense mais nisso.
Não pense mais.
Não fique mais imaginando, imaginando,
pensando no porquê....
no que aconteceu,
no que não aconteceu ...
Senão vai ter mil passados e nenhum futuro.
Não pense mais.
Não vale a pena."

11. Filme - “Tão Longe, Tão Perto” (“In Weiter Ferne, So Nah!” - 1993)
-“Os olhos são a luz do corpo. Se os olhos forem bons, o corpo será luminoso. Mas se forem maus, o corpo estará em trevas”. É com esta citação de Mateus (VI, 22) que o diretor Wim Wenders inicia o filme.

12. Filme - Blade runner, o caçador de andróides:
-"Pena que esses momentos vão se perder no tempo como lágrimas em uma noite de chuva".

13. Filme - Rapsódia em agosto:
Em uma localidade do Japão, duas amigas idosas se encontram e ficam horas, em companhia uma da outra, em silêncio. Alguém diz:
-“Existem pessoas que ficam silenciosas quando falam.”

14. Filme - A partida:
Pequeno e marcante diálogo:
-“O que é isso?
-Uma pedra-carta. Os antigos, antes da invenção da escrita procuravam uma pedra que expressasse seus sentimentos e a davam aos seus entes queridos. Quem recebia a pedra podia ler os sentimentos do outro pelo peso e textura. Por exemplo, uma pedra lisa era sinal de um coração sereno. Uma pedra áspera, de que a pessoa estava em dificuldades.”

15. Filme - Em minha terra:
-“A verdade é uma mulher. Todos a reconhecem, mas ninguém a conhece.”

16. Filme - Netto e o domador de cavalos
-“Passo meus dias dedicados aos serenos prazeres da contemplação.”
-“A função da memória é a imortalidade.”

17. Filme - Plenty:
-“...Você tem que viver antes de escrever...”

18. Filme - Antes de partir:
-"Encontre a alegria de sua vida."
-"Ele morreu de olhos fechados mas de coração aberto."

19. Filme - Mentiras sinceras:
-“Aqui estou eu, pensando que era feliz ...” (marido traído)

20. Filme - O julgamento do diabo:
-“É bom termos alguém por perto, para nos avisar que não existe atalho para a felicidade.”

21. Filme - Confidencial:
-"Melhor arrependida que curiosa": palavras atribuídas a Marylin Monroe.
-"Minha vida toda eu quis criar um trabalho de arte,
eu cantei, ninguém ouviu,
eu pintei, ninguém olhou..." ( Um dos assassinos diz)
-"Bebida, suicídio para os que não têm coragem."
-"...A vida é dolorosa. É uma experiência que reúne o rico e o pobre. Acho que sou capaz de suportar isso porque transformo o que me fere em arte."

22. Filme - Conversando com Deus:
-"Não se preocupe com os outros. Concentre-se no que você pensa de você."
-"Viver a vida sem expectativas, sem a necessidade de resultados, isso é liberdade."

23. Filme - Bambi 2:
Bambi pergunta ao pai se ele teria medo (em uma determinada situação). O pai responde:
-“Talvez, mas ainda assim eu iria.Um príncipe pode ter medo, mas não pode deixar que o medo o impeça de agir.”

24. Filme - O segredo de Beethoven:
-“A música é o idioma de Deus.”
-“A solidão é minha religião.”

25. Filme - Quase deuses:
-"...Dizem que não se viveu realmente, a não ser que se tenha muitos arrependimentos..."

26. “Comigo a anatomia ficou louca, eu sou todo coração.” Ouvi na TV e, pesquisando, encontrei como autor o cantor e compositor Jorge Mautner.

27. Filme - Herói por acaso:
-“Imagine se todos dissessem a Verdade. Seria a guerra.”

28. Filme - Um lugar para recomeçar:
-“Mais difícil que guardar... é por para fora.”

29. Filme - Poder além da vida:
-“As batalhas que lutamos estão dentro de nós.”
-“As pessoas mais difíceis de serem amadas normalmente são as que mais precisam de amor.”
-“A jornada é que nos traz a felicidade, não o destino.”

30. Filme - Notas sobre um escândalo:
-“Queremos tanto acreditar que achamos nossa outra metade. É preciso coragem para ver o real ao invés do conveniente.”
-“As pessoas sempre confiaram a mim seus segredos, mas a quem confio os meus? A você. Só a você.” Protagonista do filme referindo-se ao seu diário.

31. Filme - A pele:
-"O que você tem que abandonar para se encontrar?"
-"Todo mundo tem uma porta que gostaria de cruzar."

32. Filme - O advogado do diabo:
-"A vaidade é o meu pecado predileto."
-Colaboração do Marcos Afonso.

33. Filme - Clube da luta:
-"Só depois de perder tudo é que ficamos livres para fazer qualquer coisa."
-Colaboração do Nostradamus.

34. Filme - Entrevista com o vampiro:
-"O mal é um ponto de vista."
-Colaboração do Nostradamus.

35. Filme: Diários de motocicleta:
-"Escutei os pés descalços na lama e vi rostos emaciados de fome.
Meu coração era como um pêndulo entre ela e a rua.
Não sei com que força me livrei dos seus olhos,
me safei de seus braços.
Ela ficou, afogando sua dor em lágrimas,
atrás da janela e da chuva."
-Colaboração: Ana Regina.

36. Filme: O jardim secreto:
-"Se você olhar bem, verá que o mundo todo é um jardim!"
-Colaboração: Luana Couto