sábado, 4 de dezembro de 2010

Medo de viver e o tempo perdido

Gosto de encontrar tempo para filosofar e discutir a existência com alguns poucos amigos e amigas que têm disposição para isso. Somos tão ocupados nesta vida de muito trabalho, corrida cotidiana atrás da sobrevivência e contas a pagar. Algumas vezes lanço “provocações”, via e-mail, para ver o que acontece. Quase sempre colho resultados saborosos de vivências, compreensões e o afloramento de sentimentos bonitos que ampliam os laços de amizade. Como fiz com estas duas amigas, quase quarentonas.

Gilvan almeida

Meninas:

Relendo uma carta que mandei a uma amiga de São Paulo, encontrei este trecho e lembrei de vocês, ao mesmo tempo em que pensava naquele velho ditado: "quem avisa amigo é..." risos: "... o tempo passa mais rápido após os 18 e voa após os 40 anos...." Mas não tenham medo, aos 52 já descobri que existe vida após os 40, que pode ser época especial de mais agudeza na busca da qualidade, em tudo. Tornamo-nos mais exigentes, e com muito mais coragem de dizer o que pensamos, sentimos e queremos. Digo-lhes já: aproveitem mais a vida. Usufruam mais do viver, em todos os sentidos. Mais na frente você compreenderão melhor isto que digo. Não deixem que aconteça com vocês o que aconteceu com a Carolina, de Chico Buarque, já que, para ela: "... o tempo passou na janela, só Carolina não viu..." risos do tio un poco más vivido.. E espero continuarmos ainda por muitas décadas esta nossa amizade tão gostosa, telúrica e sideral ao mesmo tempo.

Uma amiga disse: (...) Quando descobri que queria viver TUDO (bem ao modo sagitariano, avassalador e intenso!!!!! - uma delícia - entrei em crise (também foi bom)). Na época tinha 28 anos, e uma decisão de VIVER, com mais diplomacia, mas viver, dizendo o que sentia, me permitindo "sentir o que sentia" (entendem?). Nessa trajetória medos, culpas, angústias, muita solidão. Mas descobri uma certeza: quero ficar velhinha e sorrir, olhar o tempo e sentir satisfação, e poder dizer: VIVI.
Mas hoje, as coisas estão mais acomodadas dentro de mim, talvez como reflexo de um pouco mais de paz e auto-satisfação, e sou grata pelo que já me construí; gosto mais do que sou em distintos aspectos, e vejo que ainda quero melhorar em muitos outros....
A tal coragem de falar o que PENSO, sob alguns ângulos me assusta, visto que mesmo com esse ingrediente (a coragem), que imagino tê-lo, o desafio é falar, aliás, não só falar, mas saber: quando, a hora, o lugar, o clima e o tom certo de falar (risos). Preciso aprender mais isso, inclusive, aceito auxilio.
Amigos: que venham mais décadas de convívio entre nós. Muito legal vocês se expressando mais, dizendo o que sentem no sentido de nossa amizade; é isso ai o tempo é AGORA.

Outra amiga disse: Tio amado do meu coração! (adorei o tio!), estou numa crise danada quanto a este assunto! Eu já estou com medo!
Putz, parece que os sintomas agem precocemente em mim! (risos). Os cabelos brancos estão chegando com uma satisfação que não estou entendendo! :) Uma sensação estranha da vida estar passando e eu sem saber meu lugar?! (se é que se tem um lugar). Sei não ... tempo de uma consulta para verificação das "emergências espirituais" .

Só hoje consegui ler os e-mails de vocês. Muita coisa boa, cutucadinhas básicas em um dos pontos mais frágeis do Gilvan, ou melhor, de quase todo ser humano: medos...risos. São tantos, né? Medo de mudar, de ser, de ficar, de ir, de ser deixado, de deixar, de morrer, de viver (incrível, mas verdade, medo de viver), de desagradar, de ser abandonado, de incomodar, de confiar e ser traído, de perder o amor das pessoas, de ser humilhado, de passar fome, de demonstrar sentimentos, de chorar em público, de ser criticado, e tantos outros. Quantas pessoas deixam de viver (não vivem, apenas existem, como diz o escritor Oscar Wilde), por medo de sofrer, de perder o objeto de seu amor, de se expor e de ousar. Quanta covardia existencial como pano de fundo da infelicidade e das doenças físicas e psicológicas.
Aliás, o que é mesmo viver? Acredito que cada ser humano tem uma definição própria, de acordo com a idade e o tamanho da busca e dos horizontes. Viver com responsabilidade por seus próprios pensamentos, sentimentos e atos dá muito trabalho e exige coragem, esforço constante, superação de limites. Nem todos querem isso, e, para a maioria, é melhor fugir, “tocar a vida com a barriga”. Dá medo olhar para si e se perguntar: “é esta a vida que eu queria para mim? Estou vivendo o que sonhei?" As respostas, às vezes, são cruéis.

Um comentário:

Faide disse...

Gilvan,
pra mim o agravante nessa história que é a vida,ou melhor,nossa história,é que sabemos muito e fazemos tão pouco,ou melhor pensamos que sabemos...nos encolhemos...
Colocamos nossa vontade em prática e fechamos os olhos de nosso coração.E aí sim,o que tínhamos para receber de tantas pessoas e coisas que nos recusamos conhecer,se torna no final,o vazio de não termos nos expostos a mais um pouco de "risco"
nessa maravilhosa viagem, e os cruéis questionamentos internos com certeza não nos darão a paz plena...
bjo
f@ide :)