domingo, 31 de maio de 2009

Prêmio Loucos pela Diversidade

Conheci o Dr. Paulo Amarante na primeira aula que tive na Especialização em Saúde Mental, promovida pela Universidade Federal do Acre, em 2005. Forte batalhador pela implantação da Reforma Psiquiátrica em nosso país, considero que ele e a Dra. Terezinha Freitas (UFAC) foram fundamentais em minha sensibilização para o trabalho que atualmente desenvolvo na área de Saúde Mental. Compartilho estas informações, no sentido de fazer crescer o conhecimento público sobre este universo tão estigmatizado e segregado socialmente.

Gilvan Almeida

Pesquisador fala da primeira edição do Prêmio Loucos pela Diversidade - 29/05/009

Uma parceria entre a Secretaria da Identidade e da Diversidade Cultural do Ministério da Cultura (MinC) e o Laboratório de Estudos e Pesquisas em Saúde Mental e Atenção Psicossocial (Laps) da Escola Nacional de Saúde Pública (ENSP)/Fiocruz deu início ao Projeto 'Loucos pela Diversidade', que visa estimular a produção artístico-cultural de pessoas em sofrimento psíquico. Uma das medidas resultantes dessa cooperação foi o lançamento, em maio de 2009, do 'Prêmio Loucos pela Diversidade'.
O pesquisador da ENSP e coordenador do Laboratório de Estudos e Pesquisas em Saúde Mental e Atenção Psicossocial conversou com o Informe ENSP e fez um balanço sobre o projeto, falou da primeira edição do prêmio e contou como anda o movimento pela luta antimanicomial no país.

Informe ENSP: O que é o projeto 'Loucos pela Diversidade'? Que balanço é possível fazer dele?

Paulo Amarante: O Projeto 'Loucos pela Diversidade' nasceu de uma cooperação entre a Secretaria da Identidade e da Diversidade Cultural do Ministério da Cultura (MinC) e o Laboratório de Estudos e Pesquisas em Saúde Mental e Atenção Psicossocial (Laps) da ENSP/Fiocruz para estimular a produção artístico-cultural de pessoas em sofrimento psíquico. A primeira medida foi a convocação de uma oficina, realizada aqui na ENSP em agosto de 2007, para a qual foram convidadas todas as pessoas que participam de projetos culturais no campo da saúde mental, seguindo uma tradição iniciada na gestão do ministro Gilberto Gil, que é a de envolver os sujeitos políticos como protagonistas na formulação e gestão das políticas que lhes dizem respeito.
O balanço é extremamente positivo. A partir do projeto 'Loucos pela Diversidade', foi possível viabilizar a realização de várias atividades culturais em vários eventos de saúde, como no 'II Fórum Internacional de Saúde Coletiva, Saúde Mental e Direitos Humanos', em maio do ano passado, no Rio de Janeiro, no 'Congresso Brasileiro e Mundial de Epidemiologia' da Abrasco, em Porto Alegre, no 'I Congresso Brasileiro de Saúde Mental', em dezembro, em Florianópolis, e, já neste ano, no 'Congresso Internacional de Saúde Mental e Reformas Psiquiátricas' em Salvador.


Informe ENSP: Uma das primeiras iniciativas concretas desse projeto é esse edital ao 'Prêmio Loucos pela Diversidade'? O que é o Prêmio e a quem se destina?

Paulo Amarante: A oficina deu origem a uma série de propostas para o fomento, difusão e preservação dos trabalhos realizados neste campo. Uma dessas propostas foi a realização de um edital de prêmios para estimular os projetos existentes e desencadear novos projetos. Poderão concorrer pessoas ou grupos de qualquer área da arte e cultura, desde que o trabalho artístico seja desenvolvido, pelo menos em parte, por pessoas em sofrimento mental. Poderão participar pessoas ou grupos avulsos ou ligados a instituições ou organizações não governamentais.

Informe ENSP: Ao todo, quantos projetos serão contemplados, e qual é o valor total dos prêmios?

Paulo Amarante: O edital concederá 55 prêmios, inclusive com previsão de critérios de regionalização para que todas as regiões do país tenham possibilidade de serem contempladas. Serão destinados 7 (sete) prêmios paras as iniciativas ligadas a instituições públicas, 8 (oito) prêmios para iniciativas de organizações não governamentais, 20 (vinte) para grupos autônomos e 20 (vinte) para pessoas físicas. Os prêmios para grupos serão de R$ 15 mil, e os de pessoas físicas R$ 7,5 mil. Os prêmios serão pagos com recursos da Caixa Econômica Federal; um apoio fundamental e que abre muitas perspectivas políticas para a questão da inclusão social das pessoas em sofrimento mental. Acreditamos que essa iniciativa da Caixa venha a estimular outras instituições a abrirem seus financiamentos para projetos sociais desta natureza.

Informe ENSP: O Prêmio é uma iniciativa do Laps/ENSP/Fiocruz e o MinC. Qual é a perspectiva de vocês em relação aos trabalhos a serem inscritos?

Paulo Amarante: A idéia do prêmio surgiu na Oficina, com a participação das pessoas diretamente envolvidas nos projetos pioneiros dessa área em todo o Brasil, como disse anteriormente. E a decisão de lançar o edital marcou o início de uma política absolutamente inovadora, ousada, revolucionária, de reconhecer a produção artístico-cultural das pessoas em sofrimento mental e criar fontes de apoio, dar visibilidade social etc., com recursos provenientes da cultura, ou a partir da mediação da cultura, como foi o caso da Caixa. Não se trata mais de colocar algum recurso para estimular um trabalho terapêutico através da arte, mas sim de propiciar arte, de propiciar cultura. Por isso a expectativa é boa por enquanto, mas será excelente nas próximas versões do edital, nas próximas chamadas que, esperamos, ocorram regularmente a partir de agora.

Informe ENSP: Por que homenagear Austregésilo Carrano nessa primeira edição?

Paulo Amarante: Austregésilo Carrano foi uma pessoa que deu a vida pela luta antimanicomial, pela reforma psiquiátrica. Foi vítima de violências e constrangimentos diversos em algumas instituições psiquiátricas e escreveu uma obra muito importante relatando suas passagens pelos hospícios. O livro, intitulado 'Cantos dos malditos', se tornou uma ferramenta de denúncia das práticas das instituições psiquiátricas e acabou inspirando a diretora Laís Bodansky para realizar o filme 'Bicho de 7 cabeças' – o filme mais premiado da filmografia brasileira – que levou para o grande público a realidade da psiquiatria brasileira. O livro, em si, é um importante trabalho cultural, literatura e denúncia ao mesmo tempo. A SID (Secretaria da Identidade e da Diversidade Cultural) tem como tradição homenagear nos seus editais de premiação pessoas de destaque do segmento cultural em que atua. Juntos, decidimos homenagear Austregésilo Carrano nesse primeiro edital. Falei com sua mãe e filha, que ficaram muito emocionadas com o reconhecimento.

Informe ENSP: Essa questão de trazer a diversidade cultural como forma de inclusão de pessoas com algum tipo de transtorno mental é um dos frutos da reforma psiquiátrica no país. Como anda esse processo atualmente? Em recente evento aqui na ENSP, na abertura do Curso de Especialização em Saúde Mental e Atenção Psicossocial, o cineasta Helvécio Ratton disse que há um movimento pela volta dos manicômios. Isso está realmente em pauta?

Paulo Amarante: A luta é permanente. A defesa dos manicômios é e será feita sempre por parte dos proprietários de hospitais psiquiátricos, por parte dos setores acadêmicos conservadores, que vivem da doença e não da saúde mental, que vivem, de uma forma ou de outra, do que o professor Carlos Gentille de Melo denominava 'a indústria da loucura'. Muitos dos segmentos da universidade ligados à indústria farmacêutica também defendem a volta aos manicômios porque defendem a idéia de que o sofrimento mental é tão-somente um problema orgânico, pois assim eles vendem mais remédios ou ajudam a vender mais remédios. Por sorte, no mundo inteiro, muito particularmente nos EUA e no Brasil, estão surgindo movimentos fortes de denúncia desses setores acadêmicos com as fraudes nos protocolos de pesquisas, com a compra de artigos que favorecem a medicalização e assim por diante. Mas, sobretudo no Brasil, temos um movimento social forte de luta pela reforma psiquiátrica que garantirá o avanço. E, posso afirmar que, desta vez, non passarán! Mas, nunca é demais aproveitar para reivindicar a 'IV Conferência Nacional de Saúde Mental', para rearticularmos e revigorarmos nossas forças e estratégias.

Informe ENSP
Matéria: http://www.ensp.fiocruz.br/portal-ensp/noticia/index.php?id=16731

2 comentários:

Unknown disse...

Muito interessante, muito importante, Gilvan...
Esse tipo de ação faz com que tenhamos a teimosia da esperança...
Abraços,

Marcos Afonso.

FAIDE disse...

Oi Gilvan?!realmente, conhecer e interagir com pessoas que fazem o que deve ser feito,que dão seu melhor,assim como esse grande(digo em sentidos variados) projeto tão necessário ao bem estar social,é fundamental na vida de quem se preocupa em fazer do mundo um lugar melhor, obviamente os benefícios serão de todos e para todos.Lutar para mudar a realidade de,como você citou,um universo tão estigmatizado e segregado que é o da área de saúde mental,não é uma tarefa fácil de ser executada.Então parabéns aos que deram início e continuação ao projeto "Loucos pela Diversidade" e para você pelo ótimo trabalho que faz na área de saúde mental.
NAMASTÊ
ABÇO
FAIDE.